Ele lê rapidamente a placa na parede daquela casa:
Joga-se búzios, tarô, faço trabalho de amarração.
Mãe Vera da Bahia.
Resolve entrar. Na ante-sala várias pessoas
aguardavam para serem atendidas.
Uma moça de olhar triste e perdido. Um homem de
gestos afeminados.
Uma senhora de idade avançada. Lá dentro do quarto
penumbre luzes vindas de velas, sente o cheiro forte de defumação que não
demora, invade a casa.
Observa os móveis. Realmente mãe Vera vive bem:
aparelhos novos estão por toda a espaçosa casa. Uma jovem auxiliar preocupa-se
em receber antecipadamente o valor da consulta. A moça de olhar perdido puxa
conversa com a outra mulher. Sussurra que precisa amarrar um homem casado.
Envolvera-se com ele no ambiente de trabalho e mesmo sabendo que é casado, possui
filhos, acha precisa tê-lo a qualquer custo. Diz que já foi em vários terreiros
falou com Exus e Pomba Giras que lhe recusaram o pedido.
Alegavam que ela não devia deixar um impulso,
acabar com a vida daquele homem. Ainda segundo ele os Exus ponderaram que se
tivesse paciência arrumaria alguém livre para amá-la com o desprendimento que
merecia.
Nada disso a comove queria o tal homem casado e
pagaria o que fosse preciso...
A mulher que a ouvia calada concordou com os
argumentos usados.
Por sua vez disse que estava ali para acabar com
sua vizinha, mulher nova e bonita que nunca havia lhe feito nada, ao contrário
até tratava-a bem, mas ela não podia suportar a felicidade da outra. Pagaria
dona Vera para matá-la na magia. O homossexual ouvindo a conversa resolve-se
abrir:
Apaixonara-se por um homem e este embora nunca
tenha destratado deixou claro que era noivo feliz e nunca iria se envolver com
ele.
Sendo assim estava ali para que tal mãe de Santo
amarra-se seu homem... Não notara a presença dele.
Em seu intimo está revoltado. Pois a tão poderosa
mãe de Santo não passa de uma mulher inescrupulosa que usa a baixa
espiritualidade para alimentar a ganância, a cobiça, o ódio nas pessoas.
Não percebe a tal mulher que ao fazer isso está
apenas sendo como instrumento dos Kiumbas. Lá no quartinho alheia ao que se
passara na ante-sala D. Vera acaba de atender mais um cliente.
Envolta pela fumaça e com todas aquelas velas
acesas, além de várias imagens de Exus, a mulher de fato impressiona. Ela não
está só: um grande Kiumba e seu séqüito estão ali prontos a usá-la e sugar as
energias daquela gente que ela atende.
O Kiumba está feliz: lá fora mais vitimas. D. Vera
também está, pois vai ganhar um bom dinheiro.
Não sabem e que terão uma grande surpresa. O homem
que até então estivera ouvindo aquelas pessoas, pede licença para passar na
frente, pois tem que viajar com urgência. Os três consulentes medem de cima a
baixo, vêem que estão diante de alguém importante e resolve aceitar o pedido.
Ele entra no quarto, D. Vera sente o coração bater
mais forte. Acha graça até daquele homem tão imponente estar em sua casa, hoje
pensa ela, vai faturar alto. O Kiumba se alvoroça, percebe que aquele homem
está olhando para ele. Mas como pode ser isso? E aí percebe ter cometido um
erro enorme: o tal homem era um Exu de Lei. A força do Exu lhe envolve de tal
maneira que ele sente sair dali com urgência. E assim faz: desaparece deixando
só a mãe de Santo. Por sua vez D. Vera começou a tremer e soar frio.
Tenta chamar ajuda, mas a voz lhe falta. Pensa que
o estranho irá ajudá-la, mas este se limita a olhar para ela sorrindo.
Diz então que chegava a hora dela pagar por
prejudicar e enganar tanta gente. Mostra que a mediunidade é como Dom Divino e
como tal deve ser respeitada e usada para a pratica do bem, nunca para
enganarem, jamais para causar discórdia e dor.
Completei o sermão usando mostrando que é: um
Guardião de Exu de Lei. D. Vera está embasbacada, não sabe o que fazer. Suas
pernas não obedecem...
Exu aproxima-se dela e a medida que ele avança ela
cai. Quando percebe seu espírito está ao lado do corpo.
Desesperada ela grita, tenta voltar, mas agora é
tarde. Exu agarra fortemente. Neste instante os consulentes ouvem o corpo que
cai.
Exu gargalha e some.
Não mentira: iria viajar em direção do vale das
Sombras tendo ao lado mais uma futura hospede.
Por Cássio Ribeiro
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