A meditação
e o sagrado
Há silêncio
entre duas notas; há silêncio entre dois pensamentos, entre dois movimentos; há
o silêncio entre duas guerras; há silêncio entre marido e mulher antes que
comecem a brigar. Não estamos falando dessa qualidade de silêncio, porque eles
são temporários, desaparecem. Estamos falando de um silêncio que não é
produzido pelo pensamento, que não é cultivável, que só chega quando você tiver
compreendido todo o movimento da existência. Nisso há silêncio, não há pergunta
e resposta, não há desafio. Não há busca, tudo terminou. Nesse silêncio há um
grande sentido de espaço e beleza e um extraordinário sentido de energia. Então
chega aquilo que é eternamente, intemporalmente sagrado, que não é o produto da
civilização, o produto do pensamento. É esse o movimento integral da meditação.
- This Light in Oneself, p 44
O que a
meditação não é.
Para
descobrir o que é a meditação, a beleza disso, não a palavra – a palavra
significa ponderar, pensar, recordar – então para descobrir o que é meditação
devemos abordá-la negativamente. Ou seja, descobrir o que não é. Entendem? A
maior parte de nós é tão positiva, e pensamos que a meditação é algo que temos
que fazer, praticar, mas se podemos abordá-la com inteligência, não com o
desejo, mas com a inteligência, que é ver o que ela não é. Então vamos fazer
isso juntos? Ver o que ela não é. - The Beauty of Death as Part of Life
Meditar e
escutar
Raramente
escutamos o som do latido de um cão, ou o choro de uma criança ou o riso de um
homem que passa. Nós nos separamos de tudo, e então desse isolamento olhamos e
escutamos todas as coisas. É essa separação que é tão destrutiva, pois nisso
repousa todo o conflito e confusão. Se você escutasse em completo silêncio o
som daqueles sinos, estaria viajando nele – ou, melhor, o som o transportaria
através do vale e sobre o monte. A beleza disso é sentida somente quando você e
o som não estão separados, quando você é parte dele. A meditação é o fim da
separação não por qualquer ação da vontade ou do desejo. A meditação não é uma
coisa separada da vida; é a verdadeira essência da vida, a verdadeira essência
do viver diário. Para escutar aqueles sinos, para ouvir o riso daquele camponês
quando ele passeia com a esposa, escutar o som da campainha da bicicleta da
pequena menina quando ela passa; é a vida inteira, e não simplesmente um
fragmento dela, que a meditação abre. - Meditations, p 20
Se o cérebro
pode ficar quieto
A meditação
é para descobrir se o cérebro, com todas as suas atividades, todas as suas
experiências, pode ser absolutamente aquietado. Não forçado, porque no momento
em que você força, há dualidade. O ente que diz, “eu gostaria de ter
maravilhosas experiências, portanto eu devo forçar minha mente para ficar
quieta” nunca o fará. Mas se você começa a inquirir, observar, escutar todos os
movimentos do pensamento, seu condicionamento, suas buscas, seus medos, seus
prazeres, ver como o cérebro opera, então verá que o cérebro torna-se
extraordinariamente quieto; essa quietude não é dormir, mas é tremendamente
ativa e, por conseguinte quieta. Um grande dínamo que esteja funcionando
perfeitamente dificilmente produz um som; somente quando há fricção é que há
ruído. - Meditations, p 4
Simplesmente
escutando o ruído do pensamento
A meditação
é algo bastante extraordinário, se ela tem lugar, não em momentos excepcionais,
mas a todo tempo, se você está consciente quando entra no ônibus, ou no carro,
ou quando está conversando com alguém; consciente do que você está fazendo,
sentindo, pensando; consciente de como o pensamento opera de acordo com o
prazer e a dor, não condenando nenhuma atividade ou pensamento, mas
simplesmente escutando o ruído do pensamento. A partir daí você realmente tem
uma mente extraordinária que é tremendamente alerta. Estando quieta,
silenciosa, uma coisa nova pode acontecer. A novidade não é reconhecível. Esta
coisa sublime, qualquer que seja o nome, isso não importa, não é algo que seja
unido pelo pensamento, e, por conseguinte é a plenitude da criação. - The
Collected Works vol XVI, p 148
Perseguindo
cada pensamento à raiz
Para dar fim
ao pensamento, primeiro eu tenho que entrar no mecanismo do pensar. Tenho que
compreender o pensamento completamente, lá no fundo do meu ser. Tenho que
examinar cada pensamento, não deixando um pensamento escapar sem que seja
inteiramente compreendido, de maneira que o cérebro, a mente, todo o ser
torne-se atento. No momento em que eu persigo cada pensamento à raiz, até o fim
completamente, verei que esse pensamento termina por si mesmo. Não tenho que
fazer nada a respeito porque pensamento é memória. Memória é o registro da
experiência; e enquanto a experiência não for completamente, inteiramente,
totalmente compreendida, ela deixa um registro. No momento em que eu tenha
experimentado completamente, a experiência não deixa nenhum registro. Portanto,
se entrarmos em cada pensamento e enxergarmos onde está o registro e
continuamos com esse registro como um fato – então esse fato se abrirá e
findará esse processo particular de pensamento, de maneira que cada pensamento,
cada sentimento é compreendido. - Krishnamurti on Education, pp 119-120
Entenda a
atividade do eu
Quando
existe a atividade do eu, a meditação não é possível. Isto é muito importante
de compreender, não verbalmente, mas realmente. A meditação é um processo de
esvaziamento da mente de toda a atividade do eu, toda a atividade do “mim”. Se
você não compreende a atividade do eu, então sua meditação apenas conduz à
ilusão, à autodecepção, a mais distorção. Portanto, para entender o que é a
meditação, você deve compreender a atividade do eu. O eu tem tido mil
experiências loquazes, sensuais ou intelectuais, mas está entediado com elas
porque elas não têm nenhum significado. Desejar experiências mais amplas, mais
expansivas, transcendentais é parte do “mim”. - This Light in Oneself, p 72
A meditação
é o fim do sofrimento
A meditação
é o fim do sofrimento, o fim do pensamento que cria medo e sofrimento – o medo
e o sofrimento na vida diária, quando você é casado, quando você vai ao
trabalho. Nos negócios você deve usar seu conhecimento tecnológico, mas quando
esse conhecimento tecnológico é usado para propósitos psicológicos – para
tornar-se mais poderoso, ocupar uma posição que lhe dá prestígio, honra, fama –
ele origina somente antagonismo, ódio; uma mente assim possivelmente jamais
entende o que é a verdade. A meditação é a compreensão do modo de vida, é o entendimento
do que é o sofrimento e o medo – e ir além deles. - Talks & Dialogues
Saanen 1968, p 94
Para
eliminar todo o conflito
Parte da
meditação é para eliminar completamente todo conflito, internamente e então
externamente. Para eliminar o conflito tem-se que compreender este princípio
básico: o observador não é diferente do observado, psicologicamente. Quando há
raiva, não há nenhum “eu”, mas um segundo depois o pensamento cria o “eu” e
diz: “eu tenho raiva” e introduz a ideia de que não devo ser raivoso. Então
existe a raiva e o “eu” que não deve ser raivoso; a divisão traz conflito.
Quando não existe divisão entre o observador e o observado, e, portanto somente
a coisa que é, a qual é a raiva, então o que acontece? A raiva continua? Ou há
um fim total da raiva? - The Wholeness of Life, p 142
Uma luta interminável
A meditação
como é em geral aceita hoje em dia, é a prática de um sistema, respirando
adequadamente, sentando na posição correta, querendo ou ansiando uma
experiência maior, ou a experiência suprema. É isso o que estamos fazendo. E
tudo isso é uma luta constante, uma luta sem fim. Isso que espera terminar toda
a luta é uma luta interminável! Vejam o que fizemos. Eu luto, luto, luto para
acabar com a luta em alguma ocasião no futuro. Vejam que peça eu preguei a mim
mesmo. Estou preso no tempo. Eu não digo “Por que haverei de lutar de todo?” Se
eu conseguir acabar com essa luta isso é iluminação. - Total Freedom, p 334
Não se concentre
Quando você
quer concentrar-se naquilo que você pensa que está certo, na sua imagem, Deus,
ou ideia, frase, particulares, você foca a sua mente nisso; mas a mente
perde-se, e você a faz recuar; de novo ela se perde e de novo você a faz
recuar; você joga este jogo para o resto da sua vida. E isso é o que vocês chamam
de meditação, esta batalha – forçar a mente quando ela não está interessada em
algo, e tentar controlá-la. E se você visse isso, se você compreendesse a
verdade dessa questão ou a falsidade desse processo, então jamais se
concentraria, quer estivesse na escola aprendendo um assunto específico, quer
estivesse ensinando numa escola. Não se concentre, quando está em seu
escritório ou quando está tentando meditar. Não se concentre; isso somente
exclui, cria uma resistência, um foco, dando maior força ao centro e por isso
limitando o espaço. Ora, se vocês compreenderem tudo isso, então dessa
compreensão vem a consciência, que não é de modo nenhum misteriosa. - The
Collected Works vol XIV, p 301
Meditação e controle
Na meditação
clássica, comum, os gurus que a propagam preocupam-se com o controlador e o
controlado. Eles dizem para vocês controlarem os seus pensamentos porque desse
modo vocês terminarão o pensamento, ou terão somente um pensamento, mas nós
estamos investigando quem é o controlador. Vocês poderão dizer “É o eu
superior”, “É o espectador”, “É algo que não se pensa”, mas o controlador faz
parte do pensamento. Obviamente. Portanto, o controlador é o controlado. O
pensamento dividiu-se como o controlador e aquilo que ele vai controlar, mas é
ainda a atividade do pensamento… Assim, quando se compreende que todo o
movimento do controlador é o controlado, então não há controle. É perigoso
dizer isso a pessoas que não o compreenderam. Não estamos defendendo que não
haja nenhum controle. Estamos dizendo que quando há a observação de que o
controlador é o controlado, que o pensador é o pensamento, e se você permanecer
com essa verdade completa, com essa realidade, sem mais nenhuma interferência
do pensamento, então você tem um tipo de energia totalmente diferente. - This
Light in Oneself, p 32
A meditação não pode ser um sistema
Então a
Meditação não é Meditação consciente. Percebem isto? Não pode ser meditação
consciente, seguindo um sistema, um guru – Meditação coletiva, Meditação de
grupo, Meditação individual, de acordo com Zen ou algum outro sistema. Não pode
ser um sistema, porque então vocês praticam, praticam, praticam, e os seus
cérebros tornam-se mais e mais obtusos, mais e mais mecânicos. Então, existe
uma Meditação que não tem direção, que não tem consciência, não é deliberada?
Descubram. - Last Talks at Saanen 1985
A meditação não é diferente da vida
Meditação
não é algo diferente da vida cotidiana; não vá ao canto de uma sala e medite
durante dez minutos, e então saia e seja um açougueiro - tanto metaforicamente
quanto realmente. Meditação é uma das coisas mais sérias. Você pode meditar o
dia todo, no escritório, com a família, quando você diz "eu te amo" a
alguém, quando você está observando suas crianças. Mas então você as educa para
tornarem-se soldados, para matar, serem nacionalizados, para adorar a bandeira,
educando-as para entrar nessa armadilha do mundo moderno.Observar isso tudo,
perceber a sua parte nisso, tudo isso é parte da meditação. E quando você
meditar assim, você encontrará uma beleza extraordinária; você agirá
corretamente a todo momento; e se você não agir corretamente em um certo momento
isso não importa, você voltará novamente - você não gastará tempo em
arrependimento. Meditação é parte da vida, não algo diferente da vida. - The
Flight of the Eagle, p 46
O mantra perdeu seu significado
O que é
meditação? É fugir do barulho do mundo? Ter uma mente silenciosa, uma mente
quieta, uma mente pacífica? E você pratica sistemas, métodos, para tornar-se
ciente, para manter seus pensamentos sob controle. Você senta de pernas
cruzadas e repete algum mantra. Eu fui informado de que o significado
etimológico da palavra 'mantra' é 'refletir sobre não tornar-se'. Esse é um dos
significados. E também significa 'absolver, deixar de lado toda atividade
auto-centrada'. Esse é o real significado raiz de mantra. Mas nós repetimos,
repetimos, repetimos, e continuamos com nosso interesse próprio, nossas
maneiras egoístas, e assim o mantra perdeu o seu significado. Assim, o que é meditação? -
That Benediction is Where You are, p 75
Siddhis são como luzes de velas
Vocês fazem
todo tipo de coisas para chegar a esta estranha beleza do silêncio. Não façam,
apenas observem. Olhem, senhores, vocês sabem que nisso tudo há vários poderes
de clarividência, ler o pensamento de alguém. Existem vários poderes, vocês
sabem do que eu estou falando, não? Vocês os chamam siddhis, não? Vocês sabem
que todas essas coisas são como velas - luz de velas ao sol? Quando não há sol,
há escuridão, e então a luz de uma vela é muito importante; mas quando há sol,
a luz, a beleza, a claridade, então todos esses poderes, esses siddhis são como
luzes de velas. Eles não têm valor, absolutamente. E quando você tem a luz, não
há nada mais - desenvolver vários centros, os chakras, kundalinis, vocês sabem,
esse negócio todo. Você precisa de uma mente sã, lógica, razoável, não de uma
mente estúpida. Uma mente embotada pode sentar-se por séculos respirando,
concentrando-se nos vários chakras, e vocês sabem todo esse jogo com kundalinis
- isso não pode nunca chegar àquilo que é atemporal, que é a real beleza,
verdade e amor. - Krishnamurti in India 1970-71, pp 180-181
Não é o caminho da meditação correta
E essa
constante luta para tornar-se virtuoso, para adquirir virtude através da
disciplina, através da examinação cuidadosa de si mesmo, e assim por diante,
obviamente também não é meditação. A maioria de nós é pego nesses processos, e
como eles não proporcionam entendimento de nós mesmos, eles não são a maneira
da meditação correta. Afinal de contas, sem entender a si mesmo, que base você
tem para pensar corretamente? Tudo o que você vai fazer sem o entendimento de
si mesmo é conformar-se ao seu background, a resposta do seu condicionamento. E
tal resposta ao condicionamento não é meditação. Mas estar ciente dessas
respostas, ou seja, estar ciente dos movimentos do pensamento e dos sentimentos
sem qualquer senso de condenação, para que os movimentos do ego, as maneiras do
ego, sejam entendidas - essa é a maneira da meditação correta. - The Collected
Works vol V, p 361
Meditação não é oração, nem é devoção
Oração
obviamente produz resultados; ou milhões de pessoas não rezariam. E ao rezar,
obviamente a mente torna-se quieta; pela constante repetição de certas frases,
a mente torna-se quieta. E nessa quietude há uma certa intimação, certas
percepções, certas respostas. Mas isso ainda é uma parte do truque da mente,
porque afinal, através de uma forma de mesmerização você pode deixar a mente
muito quieta. E naquela quietude existem certas respostas escondidas surgindo
do inconsciente e de fora da consciência. Mas ainda assim é um estado no qual não
existe entendimento.E meditação não é devoção - devoção a uma ideia, a uma
figura, a um princípio - porque as coisas da mente ainda são idólatras. Alguém
pode não idolatrar uma estátua, considerando-a idólatra e boba, supersticiosa;
mas se de fato idolatra, como a maioria das pessoas, as coisas na mente - e
isso também é idolatria. E ser devotado a uma figura ou ideia, a um Mestre, não
é meditação. Obviamente, é uma forma de fuga de si mesmo. É uma fuga muito
confortável, mas ainda é uma fuga. - The Collected Works vol V, p 361
Meditação não é uma repetição de palavras
Meditação é
uma maneira de viver, não uma fuga da vida. Obviamente a meditação não é ter
experiências de visões ou ter estranhas experiências místicas; como vocês
sabem, você pode tomar uma droga que expandirá a sua mente, ela produzirá
algumas reações químicas, que tornarão a mente altamente sensível e naquele
estado sensível você pode ver coisas aumentadas, ainda que de acordo com o seu
condicionamento. E meditação não é uma repetição de palavras. Vocês sabem, tem
havido uma moda ultimamente de alguém lhe dar uma palavra, uma palavra em
sânscrito, você fica repetindo aquela palavra e por isso espera atingir alguma
experiência extraordinária - o que é uma bobagem total. Logicamente, se você
ficar repetindo um monte de palavras sua mente torna-se amortecida e, portanto
quieta; mas isso absolutamente não é meditação. - Talks & Dialogues Saanen
1968, p 94
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